domingo, 9 de junho de 2013

COMPLEXO DE ÉDIPO: "O complexo do qual nenhuma criança escapa" por Juan David NASIO

“O menino está apaixonado pela mãe e quer afastar o pai; a menina, por sua vez, apaixonada pelo pai, quer afastar a mãe.” Eis em algumas palavras o mais batido clichê da psicanálise, uma ilustração tradicional, ingênua e enfática do célebre drama amoroso: o complexo de Édipo. E, no entanto, nada mais enganador que essa visão estática do complexo freudiano. Por quê? Porque o complexo de Édipo não é uma história de amor e ódio entre pais e filhos, é uma história de sexo, isto é, uma história de corpos que sentem prazer em se acariciar, se beijar e se morder, em se exibir e se olhar, em suma, corpos que sentem tanto prazer em se tocar quanto em se fazer mal.

Não, Édipo nada tem a ver com sentimento e ternura, mas com corpo, desejo, fantasias e prazer. Provavelmente, pais e filhos amam-se ternamente e podem se odiar, mas, no coração do amor e do ódio familiar, medra o desejo sexual.

O Édipo é um imenso despropósito: é um desejo sexual próprio de um adulto, vivido na cabecinha e no corpinho de uma criança de quatro anos e cujo objeto são os pais. A criança edipiana é uma criança alegre que, em toda inocência, sexualiza os pais, introduzindo-os em suas fantasias como objetos de desejo e imitando sem pudor nem senso moral seus gestos sexuais de adultos. É a primeira vez na vida que a criança conhece um movimento erótico de todo seu corpo em direção ao corpo do outro. Não se trata mais de uma boca tendendo para um seio, mas de um ser integral que quer apertar o corpo inteiro da mãe. Ora, se é verdade que a criança edipiana fica feliz ao desejar e obter prazer com isso, é mais verdade ainda que desejo e prazer a assustam, pois ela os teme como um perigo. Que perigo? O perigo de ver seu corpo desgovernar-se sob o ardor de seus impulsos; o perigo de ver sua cabeça explodir em virtude de não conseguir controlar mentalmente seu desejo; e, finalmente, o perigo de ser punida pela Lei do interdito do incesto, por ter tomado os pais como parceiros sexuais. Excitada pelo desejo, feliz com suas fantasias mas igualmente angustiada, a criança sente-se perdida e completamente desamparada. A crise edipiana é um insuportável conflito entre o prazer erótico e o medo, entre a exaltação de desejar e o medo de se consumir nas chamas do desejo.

Assim, a criança reage sem transigir. Dividida entre a alegria e a angústia, não tem outra saída senão esquecer tudo e apagar tudo. Sim, a criança edipiana, seja menino ou menina, recalca vigorosamente fantasias e angústia, pára de tomar seus parentes por parceiros sexuais e torna-se com isso disponível para conquistar novos e legítimos objetos de desejo. É assim que, progressivamente, descobre o pudor, desenvolve o sentimento de culpa, o senso moral e estabelece sua identidade sexual de homem ou de mulher.

Referência: Nasio, Juan-David. Édipo: o complexo do qual nenhuma criança escapa / J.-D. Nasio; tradução, André Telles. — Rio de Janeiro: Zahar, 2007.

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